sexta-feira, 16 de setembro de 2005

DE UM ANÓNIMO DEVIDAMENTE NÃO IDENTIFICADO

Anônimo disse...

Trabalho num - Museu, leia-se - e a situação é surreal, quase idiota.
No meu Museu, que agora vai entrar em obras, nem todas as peças têm tabelas de identificação, algumas não estão inventariadas, há peças listadas que não aparecem em lugar nenhum, há peças que aparecem e ninguém sabe de onde vieram.
O público quando vem pede sempre desconto - quando não pede desconto para ir a um jogo de futebol - a aproximação das autárquicas potencia as visitas da terceira idade. É ver, ao início da tarde, grupos de homens e mulheres que desejam paz e força nas pernas, a arrastarem a bengala para um divertimento obrigatório; "Porque o senhor Fulano de Tal que é candidato e muito nosso amigo e oferece e a gente o que quer é ver-se livre da rotina aparvalhada". Há quem passe a correr, há quem se detenha e consiga ver a beleza das obras (e ela existe), há quem se socorra do museu para passar um bocadinho da tarde à sombra. Mas de facto, e até às obras, este vai continuar a ser um espaço morto, apenas preenchido pela perspectiva das obras futuras (que vão preservar a histórica estrutura antiga), e pela proximidade de um ano lectivo que se avizinha complicado para o Museu, uma vez que o Orçamento de Estado para a Cultura não contempla um tostão para os Serviços Educativos. Não se pretende dinheiro (com menos pode fazer-se mais), mas apoio.
As pessoas que lá trabalham, fazem-no "contrariadas", como já ouvi e também arrastam o ano de trabalho saltitando entre atestados médicos. Ao abrigo de um programa denominado "Cultura e Emprego", conseguiram encaixar (o Estado, o Centro de Emprego, o Ministério da Cultura, não sei?) cerca de 500 pessoas (jovens licenciados) nos museus do IPM, sem qualquer tipo de critério de escolha. Os jovens licenciados têm trabalho durante um ano o que me parece contraproducente porque quando finalmente aprenderam algo, estão a par das colecções, sabem fazer inventariado, vêm embora.
O público que temos é assim, e a política cultural que temos, também.

A Formiga Bargante não tem nada contra os anónimos. Venham eles !

Já agora, agradecia que fossem um pouco mais explicitos, do género: "trabalho num Museu em Lisboa" ou "trabalho num Museu no Norte", enfim, algo que nos ajude a situar um pouco mais do que estamos a falar.
E têm sempre o email...

2 comentários:

Anónimo disse...

Cara Formiga:

Não conhecia o seu blog. Os meus parabens. Alias confesso que fujo o mais possivel deles para nao passar ainda mais tempo agarrado ao computador. Porém, os problemas em Portugal nao se resumem aos museus, arquivos e bibliotecas são igualmente parentes pobres e mal administrados. Neste momento escrevo-lhe da Biblioteca Nacional que nem sequer tem capacidade para fiscalizar o cumprimento da lei do deposito legal e onde os pobres leitores, como eu, nem sequer dispõem de casas de banho limpas. No entanto, de tempos a tempos cá temos novo comissário político a dormitar nas alturas de um gabinete.

Belogue disse...

No Norte, e não é um Museu Nacional. Os Museus mais visitados têm um orçamento de Estado mais, "simpático" e curiosamente situam-se na capital (Museu Nacional de Arte Antiga, Museu do Traje, Museu dos Coches). E assim se faz uma "pescadinha de rabo na boca": os mais pequenos não têm apoios, ficam sempre com uma fatiazinha mais pequena do bolo, enquanto os grandes, mesmo não tendo colecções coerentes, abarcam o resto. Têm melhores acessos, fazem parte de roteiros turísticos devidamente apoiados com todas as outras estruturas (restauração, acessos, novamente os acessos) e já são instituições com peso. Note-se que não há muito tempo, a RTP1 transmitiu um programa da tarde em directo do Museu do Traje. Ainda que o programa estivesse enquadrado no espaço, é publicidade gratuita e pura. Nada contra, mas se fazem para uns em horário nobre, não releguem os outros para o "Regiões".