domingo, 26 de fevereiro de 2006

DO LADO DE CÁ - III


Edouard Manet
A Bar at the Folies Bergeres (e pormenor)
1881-1882
Courtlauld Institute Galleries, Londres

Vais lá e roubas 2 laranjas. Vai! O que é que te custa? E já viste como elas brilham? Bem sei que só brilham vistas cá de fora, pelos nossos olhos que mal conhecem a cor das boas laranjas. Eu por mim falo: quando como laranjas, ou estão verdes que me sinto como os pintores da Idade Média que comiam o trigo antes do tempo da colheita, por causa das pestes e quando aquilo fermentava nos estômagos, tinham alucinações, ou estão tão maduras que lhes chamaria podres. São as que apanho do chão quando acaba o mercado. Como é que sei isso dos pintores? Contou-me o meu último patrão. Sim, esse onde perdi a perna. E agora bem vês, que se não fosse ter apenas uma perna em vez de duas, eu mesmo corria até ao balcão e roubava 2, 2 laranjas. Uma para ti e outra para mim, ingrato!

Vê como todos se divertem lá dentro! Entras lá com o fato que conseguimos do teu senhorio morto e tiras 2 laranjas de grande fruteira de vidro. A empregada? A empregada está a atender um senhor, não vês? Vem cá. E agora, vês ali no espelho um senhor que fala com ela? Com o teu fato novo ninguém iria perguntar o teu sobrenome e se perguntasse podias dizer qualquer coisa como: Von Bentorpe, ou De Pingelles. Não, acho que não, inventei-os agora. Mas era giro, diz lá que não era?! Entrava o Sr. De Pingelles, cumprimentava as cocottes, tirava 2 laranjas sumarentas, amadurecidas na medida certa, com mais banhos de sol que um escravo negro, a sua casca rugosa e húmida quando lhe espetamos o polegar, o esguicho nos olhos como o veneno de uma cobra que se sente ameaçada, o ardor e depois, meter-lhe o dente… Ah pois, distraí-me… Estou cá com uma larica. Deus? Deus tem maçãs no paraíso, ou porque é que achas que fez as laranjas com casca?

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