quarta-feira, 21 de março de 2007

Sábado, 10 de Março de 2007



O vermelho e o amarelo das bandeiras agitava-se no ar como um néon que brilhava ainda mais com a tensão reinante, que para além de uma festa ou uma manifestação, anunciava uma revolução. Dois senhores com idade para usufruírem do bonito serviço de pensões do Estado explicavam a um turista, cada um a exprimir-se na sua língua, utilizando sem preocupações o vernáculo da outra repleto de atropelamentos ao sotaque, o porquê da manifestação: “É por causa da ETA”, “Não é por causa dos atentados terroristas de 11 de Março?”, “Não, isso é amanhã”.
Dizem que em Espanha o desporto nacional é a inveja. (Melhor do que em Portugal que para mim tem como desporto nacional passear no centro comercial aos sábados à tarde - mesmo com o clima privilegiado de que o país goza -, tirar fotografias com o telemóvel e jantar num belo exemplar de franchising alimentar.) Pois mesmo isso está a mudar; a par das siestas, das fiestas e da inveja, o desporto nacional espanhol é a manifestação. Não há semana sem manifestação: ou organizada pelo PP utilizando como mote o fracasso das negociações entre a ETA e o governo de Zapatero, manifestações essas que têm como único objectivo tomar o poder nas próximas eleições para o cargo; ou então, organizada pelo próprio partido no governo e grupos de apoio ao mesmo. Numa semana realizaram-se duas manifestações: uma contra e outra a favor. Mas para contar manifestações existe já este site de referência, o manifestómetro, que nos dá conta do local e dimensão das manifestações em Espanha. Em Espanha, é como quem diz, em Madrid. É que se fossem contabilizadas as manifestações em intensidade por toda a Espanha, a Catalunha anti franquista ganhava o concurso. Independentemente de se concordar ou não com a política de Zapatero, que não deve ser confinada à quebra da regra de ouro que diz que com terroristas não se negoceia, este executivo tomou mais medidas que devem ser tidas em conta.

As pessoas empunhavam cartazes onde se pedia a demissão do chefe do governo espanhol, onde se falava de liberdade relativamente ao caso de Juana de Chaos (o etarra que cumpria pena e por greve de fome acabou por poder usufruir da benesse da pena em prisão domiciliária. Dito por um autóctone, Juana terá referido que o sangue das vítimas era para ele como lágrimas de alegria. A Espanha dividia-se entre quebrar um pouco ante o sopro de vida do etarra ou manter-se de bandeira em punho e repetir palavras de ordem contra o homem que lhe tinha concedido esse pequeno perdão. Quebrar sim, mas jamais torcer.

Entretanto passa um jovem apressado com o queixo friorento escondido no blusão. Na mão levava um saco de plástico e estugou o passo quando soltou um sonoro “fascistas”. O brilho dos olhos do jovem bateu no brilho do broche da senhora que explicava ao turista o propósito da manifestação. A praça elevou-se num coro, acossada pela acusação, as bandeiras elevaram-se mais alto e gritou-se desordenadamente, mesmo aqueles que muito longe não tinham percebido o dito do jovem: terrorista, filho da ****, etarra, morre, morre…

No dia seguinte, as bandeiras agitaram-se no mesmo sítio e em outros sítios por todo o país. Nesse dia 11 de Março, todos nós pudemos dizer Ich bin ein “Madridner”. Na Espanha de hoje, 3 anos após o atentado as manifestações são muitas, mas o consenso pouco. A Espanha não quer sofrer mais, nem que para isso tenha de arrancar um braço e tal como um cão, ladrar à primeira caravana que passa.

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