terça-feira, 11 de setembro de 2007

RESPOSTA AO CARO ANÓNIMO DAS 22.27 - I

É claro que num museu moderno têm de existir as duas dimensões a que se refere. Mas não é por acaso que aquilo que chama de "templo", o estudo e a conservação das colecções, surge sempre em primeiro lugar em todas as definições de museu. A razão é simples, já que apenas se pode divulgar o que antes se estuda e conserva. E a divulgação que os museus fazem tem muitas formas, das quais as exposições são apenas uma.
Se é verdade que no pós-Guerra a oposição que indica teria algum fundamento (de um lado os que defendiam já então a simbiose entre “templo” e “fórum”; do outro os que defendiam a visão tradicional do “templo” sem fórum), hoje a oposição mais comum é a inversa (de um lado os que defendem a simbiose indicada e do outro os que defendem o “fórum” sem templo).
ANÓNIMO DAS 22.27

Num ponto se me afigura que estamos de acordo: é na simbiose de "templo" e "fórum" que deve ser encontrado o equilibrio num museu moderno, como o meu caro escreve.

Só que, olhando para a prática dos últimos anos em Portugal, afigura-se-me que a marca dominante dos directores de museus tutelados pelo ex-IPM foi a de um confrangedor alheamento da função "fórum", o que fácilmente pode ser constatado pelo número de visitantes dos museus.

O "divórcio" entre os museus nacionais e os visitantes nacionais é bem claro ao analisar o periodo 2002/2006.

E este facto não contém nenhum elemento de surpresa.

A apatia dos responsáveis pelos museus nacionais situados em Lisboa, realidade que conheço melhor dado que é aqui que vivo, é um dado indesmentível.

Nada foi feito no sentido de atrair mais público para os museus.

Goste-se ou não, é também um facto adquirido que os museus se inserem hoje numa lógica de oferta cultural que concorre com muitas e variadas ofertas , culturais ou consumistas que, em função da sua eficácia, atraem, ou não, público para os museus.

E esta dinâmica "passou ao lado" dos directores de museus nacionais.

Pessoalmente, e a avaliar por alguns exemplos pessoais que conheço, esses directores cumpriram essencialmente uma função de intendência.

Alguém tinha que ser director, para dar seguimento ao expediente.

Já que eles ali estavam, deixaram-se estar.

O ministério foi cortando verbas?

Calaram-se.

O ministério não acolhia no seu orçamento verbas para aquisição de novas peças?

Calaram-se.

Nos últimos dois anos o ministério não tem dinheiro para pagar a fornecedores (veja-se o que diz o Tribunal de Contas no relatório de inspecção ao ex-IPM) ou sequer para assegurar o quadro mínimo de funcionários para manter os museus abertos na sua totalidade, mas a ministra anda numa febre de anunciar (e concretizar...) novos museus (Ermitage, Da Viagem e da Língua -será ssim o nome?-, Estação do Rossio dedicado ao multiculturalismo, etc.etc.etc.) e os directores dos museus nacionais, que devem ser os primeiros a defender as condições mínimas para desempenharem com alguma dignidade os seus cargos o que fazem?

Calam-se.

Portanto, meu caro, mais que a discussão sobre o equilíbrio entre "Templo" e "Fórum" no que aos directores dos museus nacionais diz respeito, eu creio que a discussão se reduz ao "não fazer" versus "fazer".

E a grande maioria deles não fizeram.

Limitaram-se a estar.

Continua

2 comentários:

Anónimo disse...

PALMINHAS ao post! clap clap clap!!!

só para adiantar: que validade terão os concursos públicos para os lugares de directores dos museus? Parece-me que neste caso, como em tantos outros, o factor cunha ou familiar conta, muitas vezes (nem sempre) mais do que o mérito.

uma anónima ao meio-dia

Anónimo disse...

Acho que tem alguma razão quando diz que os directores dos museus estão demasiado calados muitas vezes. Mas, para sermos mesmo justos, deveríamos acrescentar que não são só eles, e sim quase toda a gente que trabalha em museus. Eu penso que a razão não é tanto por medo das tutelas, mas porque ainda reina nos museus um certo pudor pelo Carnaval que é normalmente a imprensa e a televisão, que só faz notícia com aquilo que é escândalo. Eu acho isto mal, porque vivemos numa sociedade mediática. Lembra um bocado o anacronismo do segredo de justiça. Acho que só vai passar com o tempo, com a entrada de novos profissionais (incluindo novos directores) no mercado de trabalho.
Mas continuo a achar que a imagem que você dá é demasiado extremista. Talvez não conheça bem (em profundidade e em amplitude) o mundo dos profissionais dos museus, mesmo só dos museus de Lisboa.
Há dias numa rede de contactos da Internet (MUSEUM) havia quem lembrasse um “Manifesto pelos Museus” feito há anos (acho que há cinco anos). Esse Manifesto pode ser consultado no site do Minom (http://www.minom-icom.org / textos2.htm # MANIFESTO%20PELOS%20MUSEUS). Fui vê-lo e recomendo que o veja também. Entre os assinantes até havia directores de museus. Há-de verificar que coisas como a exigência da não criação de novos museus enquanto não se derem condições aos que já existem estão lá (e ainda agora as notícias sobre os gastos com o Hermitage em Lisboa mostram bem como essas reclamações continuam a ter actualidade, parece-me até que cada vez mais).
Depois procurei na Net e encontrei também uma notícia do DN de há dois anos (pode encontrá-la em http://dn.sapo.pt/2005/05/18 / artes/esquecimento.html) onde se fala de um documento apresentado à ministra actual, logo quando ela tomou posse, pelos directores (não sei se todos) dos museus do IPM, onde se traça também um quadro negro da situação vivida nesses museus. Ouvi até dizer que essa tomada de posição pareceu muito mal à dita ministra.
Hoje mesmo, acabo de comprar o JL e ler vários depoimentos de museólogos (incluindo mais uma vez directores de museus) com críticas, algumas semelhantes às suas.
Para si até parece que nada disto existe. Será que não o vê aí do seu computador ? Ou que, por espírito de cruzada, simplesmente se recusa a ver ?
Quanto a números de visitantes, não tenho conhecimentos para lhe poder responder. Concordo com Dalila Rodrigues quando diz que isso pode ser muito enganador porque existem muitos factores a considerar (acho que as campanhas de publicidade são um deles). Acho também que esses dados têm de ser vistos em sequencias temporais maiores e comparando o que se passa cá com o que se passa noutros países comparáveis e isto em números absolutos e em percentagens ou dinâmicas de crescimento ou de diminuição. Escolher três ou quatro anos, em período de recessão global, e concluir que as cosias estão piores, é fácil, mas talvez não seja válido. Lembro-me de ter visto numa revista que entre 1980 e 2000 os museus foram dos equipamentos culturais que tiveram maior aumento de frequência em Portugal, sobretudo na variável de visitas de grupo nacionais (excursões e escolas, acho eu). Teatros, cinemas, tiragens de publicações periódicas, etc. (menos as bibliotecas) tudo diminuiu ou estagnou. Se assim foi, acho que mais uma vez a sua visão é apocalíptica e pergunto-me porquê.
Cumprimentos,
Anónimo das 22,27 (mesmo que hoje seja a outra hora)