sexta-feira, 18 de maio de 2007

O PRIMEIRO ERRO DE COSTA

"António Costa é um excelente candidato à Câmara Municipal de Lisboa. É hábil e experiente. Tem boa imagem e bom currículo. Conhece bem a máquina partidária e a máquina do Estado. Tem experiência executiva e já provou que sabe lidar com missões difíceis (quando tomou conta do Ministério da Justiça, o país vivia obcecado com a ideia de “salvar a Justiça” – uns tempos depois, já Costa tinha desdramatizado o drama e esse nobre desígnio de jornais e comentadores foi rapidamente substituído por outro qualquer).

Costa é ambicioso e sabe que o seu futuro político dependente desta vitória e do bom desempenho que consiga a liderar a capital – e é sempre bom ter um governante pressionado para governar bem (mesmo que seja pressionado pela sua própria ambição). Pelas suas características e pelas circunstâncias peculiares em que disputa estas eleições, depois das tristes figuras do PSD ao longo deste mandato, António Costa parte para esta campanha com uma considerável vantagem em relação à concorrência. Com uma campanha serena, baseada no perfil de competência, autoridade e seriedade do cabeça de lista e numa mão cheia de propostas concretas, focadas e com os pés bem assentes na terra, dificilmente a vitória escaparia ao PS.

O essencial seria perceber a lição dada há dois anos por Carmona Rodrigues: quando se está em vantagem evitam-se polémicas, não se correm riscos desnecessários. A pressão fica sobre o adversário, basta explorar os seus erros.

Aí está uma lição que Costa não quis perceber. Consta que na sua lista estará o arquitecto Manuel Salgado. Consta mesmo (daqui a poucas horas se confirmará) que será o número dois da lista, ou seja, candidato ao lugar de vice-presidente da câmara, caso o PS vença as eleições. É o primeiro erro de António Costa. Embriagado pela sua capacidade de atracção de vedetas várias e toda a sorte de notáveis (já lá estão José Miguel Júdice e Saldanha Sanches, veremos o que os próximos dias nos trazem), não resistiu a convidar o arquitecto do regime, patrão de um dos mais importantes gabinetes de arquitectura do país e de Lisboa.

Manuel Salgado é um profissional prestigiado, um homem bem relacionado e um nome em alta no PS. Mas é possível que os seus interesses pessoais não coincidam com os interesses dos munícipes de Lisboa. Também o sugeriram a Manuel Maria Carrilho, há dois anos, e por pouco não entrou nessa lista. Segundo conta o próprio Carrilho no livro que entretanto publicou sobre a sua desastrosa experiência eleitoral em Lisboa, Salgado queria entrar para a câmara apenas para melhor promover os seus interesses profissionais. Vale a pena ler com atenção os parágrafos que Carrilho dedica a esse episódio. Por junto, acusa o arquitecto de pretender a tutela do urbanismo, desligando-se formalmente do seu gabinete de arquitectura e colocando no seu lugar um “testa de ferro”. Enfim, uma tentativa de golpe sobre a coisa pública, motivado por interesses de milhões de euros. É isto que escreve Carrilho, num livro a cujo lançamento não faltaram ministros e dirigentes do PS.

Numa autarquia que precisa, antes de mais, de credibilidade, transparência e tranquilidade, a inclusão na lista do PS de alguém tão controverso como Manuel Salgado, alguém que é alvo de suspeitas tão graves como as que Carrilho lhe lançou, é a primeira vitória do PSD. Suspeito que Fernando Negrão já tem o livro de Carrilho na mesa de cabeceira.

in: filipe santos costa - jornal expresso online de 18.5.2007 (link)

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